domingo, 22 de janeiro de 2012

Diogo Alcoforado

6.

Conhece a comum perversidade:
o desprezo dos homens - seu limite.
E todas as palavras com que cite
seus modos atravessam a cidade

e voltam ao lugar de que partiram.
Inútil qualquer grito. Qualquer gesto.
Sobra ser assim, ser um só resto
apenas evidente quando viram

seus olhos os que vêem, e não voltam.
E no centro de si sofre ainda:
o silêncio vil, a dor, a sede,

o trânsito dos passos que se soltam.
E as costas curvadas vão da finda
esperança ao fim dessa parede.

7.

Invade pelo centro a cidade
ou só a vê de longe, sem lugar
ou volta previsível, se gravar
os passos nesse muro dá à grade

de aço e de sangue gravidade
E os sulcos traçados já se cruzam:
são fundos e são breves quando usam
o mínimo caminho porque há-de

seu passo ser a forma desse rasto.
E a grade é alta: torna a dar
à dor qualquer imagem, depois cerra

o corpo nesse palco quase gasto.
E o modo de ir deixa ficar
os olhos onde mal tocam a terra.

Diogo Alcoforado, Pobres, Afrontamento.



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