sábado, 27 de setembro de 2014

João Miguel Queirós.



Perto do fogão

Ponho a sopa a aquecer num tacho pequeno.
sentado perto do fogão,
pouso os braços na mesa vazia.
Encosto ligeiramente a cabeça na parede
enquanto ouço o som da sopa ao lume.
Passados uns minutos, uma pequena sombra
percorre tranquilamente a parede, mergulhando
na penumbra o relógio, uma factura da E.D.P., o calendário,
a fotografia de família...
A ligeira corrente de ar
que passa perto de mim
leva o meu ouvido na direcção do pequeno rádio portátil,
que toca baixinho, e
deixa-me o outro ouvido
sobre o fogão. Fico à escuta.
Dentro de mim vou remisturando uma música
que desenha no meu espírito imagens,
algumas delas são bem fáceis de visualizar
mas outras são tão simples que se perdem,
deixando-me abandonado no ar,
rodeado de uma luz ligeira e suave.


João Miguel Queirós, in Poetas sem qualidades, Lisboa, Averno, 2002.

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