segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Meios de Transporte: João Cabral de Melo Neto

                      
O câncer é aquele ônibus
que ninguém quer mas com que conta;
não se corre atrás dele,
mas quando ele passa se toma;

que ninguém quer mas sabe;
e que um dia ao sair-se do sono,
lá está, semi-surpresa,
quase pontual, no seu ponto.

Sem pontos de parada,
solto nas ruas como um táxi,
sem o esperar, querer,
sem ter por que, se toma o enfarte:

táxi que, de repente,
ao lado de quem não se pensava,
pára, no meio-fio,
toma, quem não o vira ou chamara.


João Cabral de Melo Neto (1986),  Poesia Completa (1940-1980), Lisboa, Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1986.

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