domingo, 4 de setembro de 2011

Gonçalo Castelo Branco

«o insustentável peso das maçãs

desperto sem outros olhos que não a pele. sinto as memórias por
um caroço que trago fundo em mim. o futuro tem a cor da minha
imaginação e toda ela está consagrada a uma espera de décadas
para afirmar a leveza do sabor. saboreio dando tempo ao tempo
para ter o tempo por dentro, a assistir e participar do insustentável
peso das maçãs. se te digo cor é para consagrares as aparências
com as essências e encontrares cada uma em cada mão. agora
abre os olhos: o que farias hoje se hoje fosse tudo o que tivesses
sem haver um amanhã? já sei. vou comer uma maçã e lembrar-
-me de um amigo que em tempos tive e que infimamente conheci.
faço o que ele faria, também, com prazer e calma de quem não diz
adeus mas até depois. nada me fará esquecer de sentir o apito do
barco, o cheiro do pão pela manhã, a frase dita com carinho aberta
a uma morte feliz. a maçã caiu. novas árvores virão.»

Gonçalo Castelo Branco: in "Cràse" número 0. 2009.

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