A chegada dos pescadores
o levantar tão descalço dos pés
na janela sobre as águas do mediterrâneo;
um mar de terras, de continentes, de algumas ilhas -
a madeira embebida liberta olhos de tinta
e guarda a memória das redes nos braços maduros
no olhar escuro das camisas largas, nas calças de gola alta
junto à cabeça dos pés, perto dos dedos de sal -
Júlia observa calma essas fadigas longas, esses rostos gastos
essas mãos grossas e morenas que se agarram ao cais.
Júlia observa calma o prateado dos peixes distraídos
inalando à distância um odor de escamas
característico e reflectido pelos raios de sol-
enquanto no fogão, o vapor de uma sopa grande
e na mesa tosca, as malgas de esmalte quebrado
os copos de vinho e os nacos de uma broa
aos bocados -
o António Maria e o Julinho estão de volta
está na hora da fome, a hora do descanso
a hora igual de todos os dias da semana
salvo o domingo
quando vestem um fato de riscas coçado
sapatos largos como barcos
e chapéus de abas negras até à entrada da igreja
antes da água benta -
a Júlia tem marcas nos cotovelos de tantas horas paradas
e tremem-lhe sempre os seios enquanto não chegam a casa -
ao domingo veste um vestido de chita e pinta os lábios
e quando chega a noite António toca-lhe devagarinho
e ao longe as estrelas -
José Ferreira 26 Agosto 2011
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