cada homem é uma fome dentro
do sono a terra erguida
afeito ao som o nome é
o fuso do verão tecendo o calor
à medida que a fome sobe à garganta
o mel a asma dos teus dedos
peito adentro
desde o bosque
há o meu nome o teu e o mundo em redor
ou uma casa que diz como tudo é
um dos nome do mês de maio
e rodeadas de árvores as mãos
alumiando o que resta do sol
nas vidas de quem não é mais que um modo de nomear
o som audível através do gesto
que escuta sempre
o que soçobra dos estilhaços do vento
em torno das casas
há um minério profundo
o meu nome como se eu dissesse
o vinho aberto ao meio
dos joelhos bebemos sempre
o que vem depois de a chuva haver
plantando no fundo das cisternas
o que resta do nome das amêndoas
*
(de olissipo recordo)
recordo as tardes as tágides
declinadas ao longo da orla dos pomares
o mel que faziam os dias no teu rosto
enquanto nos ataúdes a raiz do sangue aguardava
que as noites crescessem verticais face
à extensão do teu nome
por entre as vigas do calor
(posso dizer que depois que)
conheci alguém no centro do mundo
(tenho sempre os mesmos sapatos;
os mesmos que pisaram paris, os mesmos
que pisaram a relva de Auchwitz
tentativa de poema concreto
homero era cego. tinha os
olhos brancos das fontes
dizia-se que com as suas mãos
movimentava as casas
e as paisagens de lugar
só de as olhar
homero via. as metáforas.
dizia-se que com tesouras
dentro da noite
semeava os olhos dentro da pedra
e escrevia depois o odor do estilhaço
dizia-se que homero
era cego
e que escrevia as palavras como
pálpebras sobre o lume. que
homero via sempre
o primeiro nascimento dos olhos
a partir de uma pedra de cal
homero é cego e vê.
a inércia como máximo movimento
e as metáforas todas estilhaçadas
numa parede branca
homero vê.
a projecção de um eco
diante de uma lâmina
a sucinta extinção da figura
arrasada pelo gesto de consumar
a sombra de uma sombra
homero é cego. vê.
as imagens desde dentro
da sua própria ausência
---------------------------
não há paisagem que seja
imóvel
o poema
como os incêndios
é um corpo sempre
em movimento
*
são fundos os rostos da memória,
enquanto
na faina do vento, os olhos amam
o cerco de uns braços em torno do peito
desde da raiz da melodia
até à rubra flor do rosto
sempre que alguém canta
nos ledos verdes campos,
a canção das searas em flor,
um alaúde estremece
na quente solidão das casas
e diz-se depois que
é um luto a mão que assina a carne melódica
na pauta do feno colhido por braços
e diz-se que
é doce a canção,
enquanto
um peito estremece numa véspera de amor
canta a voz:
é doce a viagem,
enquanto
o marinheiro decanta os astros
no cume do verso
à proa da vertigem
e cantam as mulheres em coro:
a canção é uma viagem,
e é o fado do sangue, ser sempre
a semente do rosto,
a força amante dos braços
que circunscrevem os pomares em flor
é fundo sempre um rosto amado
é rósea a mão da cor do fado,
da cor do destino de um verso:
ser de tudo sempre
o obscuro ritmo diverso
um ser de raízes à tangente da fala
*
alimento a mel os olhos
dos mortos
em lagos de vento
o pó devora as mãos
tenho a tua mão sobre o meu ombro
as águas de maio
pela cintura
talvez a minha língua tenha que voltar à origem
ao teu rosto talvez tenha que
que pôr as minhas mãos por dentro dos lugares
que tu usas como coração
talvez tenha que aprender de novo
a me desequilibrar só de respirar
Sem comentários:
Enviar um comentário